Ex-presidente do Uruguai morre aos 89 anos e deixa discurso emocionado em que reconhece a proximidade da morte e convoca as novas gerações à luta por um mundo melhor
Baseado em publicação de ICL Notícias, em 13 de maio de 2025. | Imagem: Divulgação/ICL Notícias

“Sou um velho que está muito perto de onde não se volta, mas sou feliz porque vocês estão aqui.” Com essas palavras, em tom sereno e consciente, o ex-presidente do Uruguai, José “Pepe” Mujica, se despediu da vida pública meses antes de sua morte, confirmada nesta terça-feira (13), aos 89 anos, após enfrentar um câncer de esôfago. O anúncio foi feito pelo atual presidente Yamandú Orsi, às 16h14, nas redes sociais. A despedida de Mujica, mais do que um adeus, foi um chamado à continuidade da luta por justiça social, solidariedade e educação.
No comício que marcou sua última grande aparição, Mujica disse estar “lutando contra a morte” e que havia escolhido comparecer não como político, mas como alguém grato pela vida. Falando “do coração, não da garganta”, o ex-presidente entregou ao povo uruguaio e à América Latina uma mensagem de esperança diante da finitude. Ele ressaltou a importância das novas gerações, afirmando que seus braços cansados seriam substituídos por milhares outros. “A luta continua por um mundo melhor”, declarou.
A trajetória de Mujica conferiu peso a cada frase. Ex-guerrilheiro, prisioneiro político por quase 15 anos, muitos dos quais em isolamento, foi eleito presidente em 2009 e conduziu o Uruguai por um caminho de reformas sociais inéditas no continente. Legalização da maconha, casamento igualitário, regulamentação do aborto e políticas de redistribuição de renda marcaram seu governo entre 2010 e 2015. Mas foi sua conduta pessoal, marcada pela simplicidade e coerência, que o transformou em símbolo mundial de uma política possível com ética e humanidade.
Ao recusar os luxos do cargo e optar por viver em sua chácara, dirigindo seu Fusca azul e doando a maior parte do salário, Mujica sustentou com ações o que pregava em palavras. Seu discurso histórico na ONU, em 2012, onde denunciou o consumismo e defendeu uma vida mais justa e sustentável, reforçou sua imagem como uma das vozes mais lúcidas da política global.
Em sua fala de despedida, também alertou sobre os riscos de uma sociedade desigual e sobre a importância da formação educacional. “Se não somos capazes como país de educar e formar a geração que vem, vamos pertencer ao mundo dos irrelevantes”, afirmou. E reforçou: “A inteligência será tão importante quanto o capital.”
A fala também trouxe apelos diretos à política do presente e do futuro. Mujica pediu que se rejeitassem o ódio e a confrontação. Disse que o país precisava “de um governo que abra o coração e a cabeça” e terminou agradecendo pela existência dos que continuariam a luta. “Dou meu coração a vocês. Obrigado por existirem. Até sempre.”
A morte de Pepe Mujica encerra um capítulo único da história política latino-americana. Mas o conteúdo de sua despedida, mais do que um testamento, é uma convocação. Seu legado transcende os limites do Uruguai e permanece como referência de coragem, coerência e compromisso com a humanidade.